Translate

domingo, 1 de dezembro de 2013

O jornalista salva-se recorrendo ao exagero.

Giovanni Papini - Escritor
Itália, 1881 / 1956

O jornal é, de certo modo, o teatro histórico a domicílio, obrigado a fornecer em cada número a ração de terrível e ridículo necessária para conciliar a digestão ou o sono dos seres aos quais nunca acontece nada.

Por conseguinte, o jornalista tem de recorrer continuamente ao exagero, mas sobretudo à hipérbole e, se for caso disso, à invenção. Compete-lhe vencer, à força de fantasia e literatura amplificadoras, a espantosa uniformidade da vida humana.

Todos os dias, desde milênios, sucedem uns tantos assassinatos, suicídios, roubos e incêndios - os nomes dos protagonistas e lugares mudam, porém as causas e formas são sempre, eternamente, quotidianamente, as mesmas.

O jornalista salva-se recorrendo ao exagero. Sob a sua pena, tudo assume um aspecto trágico ou satírico. Todo o terremoto que faça ruir duas casas é um «cataclismo de que nãomemória outro igual»; uma rixa entre bêbados uma «luta na via pública»; uma manifestação de mendigos «uma revolta»; a assinatura de um tratado «uma data histórica»; um orangotango amestrado «um milagre da ciência».

Todo o aviador que fratura a coluna vertebral é um «herói da mais elevada estirpe»; todo o transbordo de rios a «segunda edição do Dilúvio»; toda a prostituta que mata ou se mata a protagonista de um «novo drama de amor».

Os homens, na sua maioria sádicos, querem que o jornal lhes satisfaça o sadismo íntimo, pelo que tem de localizar, de país para país, todo o abrutalhado e malévolo que existe e apresentá-lo ainda mais bruto e mau.

Se há uma mulher de permeio, ou é possível fingir que há, junta ao bruto um pouco do porco: o famoso binômio romântico - amor e morte - traduz-se facilmente em sangue e esperma.

Giovanni Papini, “Relatório Sobre os Homens


Comentários: Para enviar por E-mail clique «AQUI»



x