Translate

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

César Maia e o plural majestático.


Cada vez que leio uma newsletter do César Maia, que ele denomina “Ex-Blog do César Maia”, sempre recordo do Dr. Fantástico, de Stanley Kubrick, e de uma das melhores e mais divertidas épocas da minha vida.

O leitor já entenderá a "conéquissão", como costuma falar um apresentador da TV Record.

No filme, o "Dr. Fantástico", de Kubrick, quando a super-fortaleza norte-americana foge do controle aéreo e se dirige a Moscow, para jogar uma bomba atômica, o presidente dos Estados Unidos pega o telefone vermelho e fala com o presidente soviético: – "Nikita, um avião dos nossos vai jogar uma bomba atômica em cima de vocês. Eu lamento muito!". Nikita responde furioso: "Eu lamento muito mais do que você!".

Quanto à melhor época da minha vida, certa vez fui contratado por uma empresa, cujo presidente tinha a peculiaridade de se expressar na primeira pessoa do plural. Talvez por descendência fidalga em uma das vidas passadas. Ou, suspeito eu, quase à certeza, devido a um encontro pessoal com o Papa João Paulo II. Um retrato ampliado no seu gabinete, em moldura graçapé, eternizava na parede central, de frente para a porta, a benção recebida.

Era impossível ignorá-la.

Visitantes incautos raramente escapuliam dos trinta minutos mínimos para a narrativa do evento e das minúcias acerca do Bispo de Roma. Eu não escapei, claro. E por ser muito educado recebi de brinde mais um quarto de hora para perceber auditivamente a suavidade das mãos do papa.

Fiquei até com inveja e não me furtei a demonstrá-la.

Os olhos do ilustre presidente brilharam e ele aprumou-se com brio. Tresandava orgulho. Percebeu que estava diante de um bom ouvinte. Mentalmente acrescentei esperançoso um zero aos honorários acertados. Na época cobrava por hora. Era moda. Nos vinte minutos seguintes tive a certeza de que nunca seria abençoado por um papa, mas o meu trabalho para aquele senhor seria altamente proveitoso.

Nem reparei quando o abençoado se tornou repetitivo. Eu havia colocado o meu sorriso número dois, o de curiosidade, e deixado a mente vagar.

Ignoro se o leitor sabe, mas papas, reis e imperadores ao falarem em público costumam usar o pronome da primeira pessoa do plural: “nós”. Chama-se plural majestático. Nunca se referem a eles próprios na primeira pessoa do singular, mas em nome de quem representam.

Eu já sabia disso. Estudei em colégio de padres. Entretanto, demonstrei o maior encanto – e interesse – ao incentivá-lo a espraiar-se nos detalhes; inclusive a explicar-me as nuances, – reais e religiosas, – que existem nessa forma de falar.

No caso do Papa, o plural majestático mantém-se até na intimidade. Reis e imperadores geralmente não.

Sendo Sua Santidade na Terra o sucessor e representante de São Pedro Apóstolo, portanto, por extensão sucessória, o porta-voz da vontade de Deus, tudo o que deseja, pensa ou faz, está implícito que não é só dele ou para ele. Conseqüentemente, quando durante a ceia, ao provar o caldo, pronuncia: – “achamos a sopa um pouco salgada, irmã!”. – Só ele acha. Para os demais, provavelmente o tempero está ótimo. Seria estranho a irmã-cozinheira, uma das esposas de Cristo, não saber a quantidade adequada do condimento ao paladar celestial.

Voltando ao "nós", quem não se recorda das lágrimas da Fafá de Belém solene, de véu na cabeça e fartos seios cobertos, ao ouvir de João Paulo II: – “Nós te abençoamos in nomine Patris et Fillii et Spiritus Sancti”. Isto é, ele e Pedro, ambos em nome de Deus e de Jesus, sob a supervisão do Espírito Santo, todos juntos, abençoavam a moça, hoje uma senhora sagrada.

Na época achei um pouco esquisito. Porém, até hoje não recordo de alguém ter visto uma procuração cartorial ou celestial ser exibida para provar que o papa está legalmente habilitado a tal incumbência. Abençoar em nome de Pedro, de Paulo ou de qualquer dos santos, de Deus, de Jesus ou do Espírito Santo?

É muita gente. Sei, não!

Mas nem é preciso. O Bispo de Roma possui infalibilidade. Por dogma, é certo, mas isso são outros quinhentos. A clarificação solene e definitiva de todos os seus pensamentos e palavras, atos e omissões gozam da assistência sobrenatural do Espírito Santo, que o preserva de todo o erro.

Eu devia ter sido padre.

Pio XII, por exemplo, ao declarar apoio ao regime nazista e fingir ignorar o massacre dos judeus, obviamente falou no plural. Ao designar o bispo Alois Hudal (também conhecido como Luigi Hudal), para ajudar e financiar criminosos nazistas a fugir, também o abençoou em “conjunto” com Deus, sob a assistência sobrenatural do Espírito Santo...

Bento XVI, o mais recente "sucessor" de Pedro, ao acobertar, perdoar e omitir os casos de pedofilia dentro da Igreja deu apenas outra prova de infalibilidade que a assistência sobrenatural do Espírito Santo lhe proporciona. Que opção tinha?

Assim como o Lula, outro exemplo de infalibilidade ex cathedra. Nos seus habituais discursos tardios para explicar ou justificar as malandragens dos seus meliantes petistas, o energúmeno mais ilustre do Brasil igualmente usa o “nós”, que ele pronuncia "nóiz", em lugar do "eu" que compete a todos que não se julguem reis, imperadores ou papas. Não é o caso do Lula. No plural, recordo-me bem, ele pediu desculpas à nação, ao reconhecer os erros do seu governo e do seu partido. Só usou o singular para declarar-se indignado. Contudo, do alto da sua auto-celestialidade que alternativa teria? Declarar-se solidário com a corrupção? Dizer que faz parte dela?

César Maia, ex-prefeito do Rio de Janeiro e hoje candidato perdedor ao Senado pelo mesmo Estado, vai além do plural majestático. Ele se exime de qualquer responsabilidade ou vontade e delega as suas falas, principalmente a escrita, à terceira pessoa no singular, “ele”.

O curioso é que o “ele” que o “nobre” político usa, é ele mesmo!

Em data decrescente, detenhamo-nos um pouco só nos últimos titulares que César Maia escreveu no seu Ex-Blog, na verdade reles span pensado por ele, escrito por ele e administrado por ele... mas claramente especificado que o conteúdo é informado por um terceiro, isto é, ele mesmo:

03/10/2010: – “SEGUNDO TURNO PARA PRESIDENTE! 1. Conforme este Ex-Blog havia previsto....” – em outras palavras, as previsões não são de César Maia, mas sim do Ex-Blog. Qualquer erro futuro é culpa do Ex-Blog, não de César Maia.

02/10/2010: – “INTERNET ELEITORAL FINALMENTE APARECEU, MAS DE BAIXO PARA CIMA! 1. Este Ex-Blog já havia comentado sobre...”. – Isto é, César Maia não comentou nada. Subentende-se que todos os comentários anteriores e presentes vieram do Ex-Blog.

01/10/2010: – “CESAR MAIA, EM ENTREVISTA AO "DIÁRIO DO VALE" (30), FALA SOBRE AS PRIORIDADES PARA O INTERIOR DO ESTADO!” – Entendeu, leitor? Já que ninguém fala dele, ele fala dele mesmo.

Gaba-te cesto, senão quem te gabará?

28/09/2010: – “CESAR MAIA DIZ QUE QUER EVITAR "KIT-CHAVISTA" DO PT! Trechos da entrevista de Cesar Maia à Folha de SP (28)”. – Entendeu o titular? Não é o César Maia a emitir uma opinião, mas é o Ex-Blog a informar o que ele, César Maia disse na entrevista.

Estes são só alguns exemplos. O leitor certamente estará se perguntando porque leio esse canalha... se o critico tanto. Bom... eu leio tudo o que me aparece pela frente. Até bula de remédio. Leio até os textos assinados pelo Lula e por Zé Dirceu, que não são deles.

No caso de César Maia a leitura é mais divertida, razão pela qual me faz recordar do "Dr. Fantástico" e do meu ilustre ex-cliente abençoado a quem me referi no início. Entretanto, sendo ele brasileiro e copiador entusiasmado do que dizem os argentinos, o divertimento é maior; pois, de forma burra e subestimando os 45.000 leitores que diz ter, Maia prefere usar a terceira pessoa do singular para falar dele mesmo, como uma espécie de necessidade de elevar-se a um patamar que só existe nos seus devaneios. Nisso está a piada.

Não surpreende, portanto, ter sido considerado um dos piores prefeitos que passou pelo Rio de Janeiro.

Realmente não sei porque embirro tanto com César Maia. Talvez por ter sido um dos piores prefeitos do Rio de Janeiro; talvez pelo seu nepotismo velado, porém muito conhecido; talvez pela dinheirama que embolsou das obras hiper-superfaturadas para a realização dos jogos Pan-americanos; talvez por ser um político dos mais execráveis, pertencente a um dos partidos mais corruptos e camaleônicos dos que existem no Brasil; talvez por se achar no direito de criticar os seus iguais e proceder exatamente no contrário desses julgamentos; talvez, por mais que ele admoeste os seus semelhantes, menos semelhança possua com um político honesto; talvez pela pretensão de supor-se dono de um ego absolutamente oposto às suas qualidades morais; talvez por sua absoluta falta de caráter; talvez por ser um fascista disfarçado de democrata; talvez por ser um estupor político que se adonou de um partido para próprio beneficio e obtenção dos fins megalomaníacos a que se propõe... Talvez... São muitos talvez.

Assim, como César Maia escreveria: FÉLIX JARRETH ALEGRA-SE COM A DERROTA HUMILHANTE QUE EX-PREFEITO SOFREU NA CORRIDA AO SENADO.

Às vezes os cariocas dão uma dentro!


Comentários: Para enviar por E-mail clique «AQUI»



x