Vínculos da Liberdade

Diante desta afirmação, seria presunção minha adotar a atitude de Heráclito que costumava chorar diante das conjeturas da vida e das coisas que realçam o conhecimento humano, e dizer: – “Se tudo se torna tudo, cada coisa contêm em si o que nega”. – Não! O supremo pecado é a superficialidade.
Neste sexto ano, do novo milênio, nesta idade extraordinária da comunicação instantânea, da globalização, do neoliberalismo, das esquerdas sem rumo, quando até a ingenuidade procura ostentar-se com certa liberdade e representa força expressiva na arte, na música, na pintura e na poesia, não é de assustar a ninguém que a humildade também apresente o seu toque de exibicionismo e seja a favor da liberdade ampla, sem peias ou dogmas. – Não obstante, é possível ignorar inteiramente todas as formas que a arte pode assumir em suas diversas manifestações ou os processos de evolução do pensamento e, ainda assim, estar cheio da mais meiga sabedoria.
A humildade ensina que há uma diferença muito grande entre os humildes e os humilhados: – as humilhações devem ser repelidas, por desumanas, mas a humildade deve ser cultivada como atributo do Criador à criatura. – A moderação e a reflexão são as maiores virtudes de um cidadão.
Dizem os especialistas que a suprema virtude dos gregos era a beleza; a dos germanos, a fidelidade; a dos persas, a coragem. — A liberdade não é suprema virtude de ninguém, mas de todos; tem amplitude e caráter universal. – Há uma grande diferença entre aqueles a quem Deus julga livres e aqueles que parecem livres aos olhos dos homens.
O mundo inteiro clama por liberdade: — uns pedem que ela abra as suas asas sobre nós; outros a vêem apenas simbolizada numa estátua ou nas asas de uma pomba branca esvoaçando no infinito do céu... Finalmente, alguns crêem na liberdade que não depende de asas, nem é símbolo, porque se traduz em mensagem viva, seja de amor, seja de sabedoria ou de trabalho.
O que importa é possuí-la sem limitações; saber usá-la com moderação para não perdê-la. Que adianta, por exemplo, ser dono da liberdade e abusar de sua posse? Será um crime de castigo ainda imprevisto o homem não ter capacidade de resguardá-la no cenário de sua vida, na comunidade de sua gente. Torná-la desacreditada é uma ignomínia.
Hoje, o mundo inteiro volta-se para a tecnologia, tentando o aperfeiçoamento de sistemas, aprendendo a produzir mais e melhor, em favor de um maior número de pessoas ou entidades, sem distinções ou preconceitos. Logo, posso afirmar: — o homem vale atualmente, mais pelo que produz que pelo que sabe.
Se o homem vale mais pelo que faz que pelo que ele sabe, precisará sempre de saber mais para fazer melhor. Necessitará mais liberdade para dar maior expansão ao seu espírito criativo. – O saber com liberdade deve estar a serviço do trabalho com método. O trabalho não pode prescindir da orientação do saber. Quando o cérebro falta, os braços não têm valor; quando o homem não raciocina, o seu trabalho não tem consistência... a sua obra não tem durabilidade.
Para que o homem seja livre, para que a sua passagem terrena se torne justificável, ele precisa produzir. Para produzir é necessário que haja motivação. Uma motivação é sempre um objetivo intelectual. Apetites não são motivação. Um homem, cujo objetivo seja tornar-se diretor ou presidente de sindicato, amanhã membro de um clube de elite, depois parlamentar de um governo ou até presidente da nação, sempre consegue realizá-lo; e esse é o seu castigo; aqueles que sonham com uma máscara são condenados a usá-la.... pela falta de motivação intelectual... por não entenderem a liberdade... por possuírem, tão somente, apetites!
Quando se trata das forças dinâmicas da vida e daqueles que as personificam, tudo se torna mais difícil. As pessoas que desejam apenas atingir a auto-realização, sem possuírem a liberdade para tal, jamais sabem para onde estão indo. Nem podem sabê-lo. Num certo sentido, os psiquiatras têm razão quando afirmam que o importante é conhecer-se a sim mesmo. Essa é a primeira meta do conhecimento livre. Mas reconhecer que a alma do homem é incognoscível é o objetivo supremo da sabedoria. O mistério final somos nós mesmos. Quando tivermos conseguido superar todos os obstáculos, contar todos os nossos pecados, perdoar todos que nos ofenderam, ainda restaremos nós. Quem pode calcular a trajetória da própria alma?
Façamos, pois, com que a liberdade tenha o fulgor de astro nas mãos do um justo e não o brilho da espada da incompetência, empunhada por um iletrado.