Translate

terça-feira, 1 de julho de 2008

Brasil do avesso, de ponta-cabeça.

No país do berimbau elegem governos com doses generosas de impaciência, inocência e boa vontade. 

Tudo na base da esperança. 

Entretanto, os poderes de fato jogam em outros campos com arteiros nunca escrutinados a quem os ventos sopram... Só a favor deles e dos seus empréstimos abençoados e orçamentos majorados. 

Ladrões!

Primeiro, enganaram. Vinte anos de propagada ética revelaram por fim que não havia ética alguma. Nunca houve. Nem sombra!

O Povo educado para um pensamento medroso, acrítico e dócil, é constantemente amansado pela televisão Globo e pelas revistas facciosas, repletas de factóides. Iludido pela retórica neoliberal, tem medo da revolução e acovarda-se às gangues de drogados e assassinos nos morros ao lado.

Domesticado, acovardado e apolítico deixou de perguntar... De questionar.

Manipula e deforma as opiniões. Quando as tem. Se as tem.

Alega que tem fé... Confiança no futuro. Vota nos mesmos políticos malfeitores; bebe leite falsificado, abastece com gasolina adulterada e acredita que os aumentos dos preços dos alimentos nacionais derivam da alta internacional.

Educado por professores ineptos e preguiçosos no aprender consegue apenas falar o "favelez" e esqueceu que o idioma nacional é o português.

O Brasil e os seus governantes reclamam o melhor do seu povo. O Povo reclama... Bom, nem tanto. De mansinho dá um jeitinho; mete o rabo entre as pernas, bate na mulher e na criança.

Mas há empenho, dedicação e esforço. Empenho de comprar a prestações largas com juros usurados. Dedicação à coscuvilhice da vida alheia. Esforço para obter e tirar vantagem de tudo e de todos, no menor prazo, pelo melhor preço; de qualquer maneira.

O Estado Brasileiro, outrora instituição admirada, passou a quase respeitável... Comporta-se hoje como um playboy devasso. Chefiado por um analfabeto sem escrúpulos, entrega-se aos prazeres e tentações de quem mais paga; passa vergonhas em público por causa dos seus vícios privados e psicoses de grandeza. Com o dinheiro da ardileza.

A Igreja, desmoralizada, repleta de pedófilos, olha o mundo com desconfiança e a pátria como um feudo. Feudo que defende a ferro e fogo dos neopentecostais; todos estes a enriquecer com desejos de ter, cada um pra si, uma TV Record. Mesmo benzendo-se perante os desvarios dos novos tempos e templos barracais, ainda põe a render o que resta da nação abençoada e temente a Deus, aos orixás e às bíblias manipuladas.

Dignidade, respeitabilidade e ética são palavras sazonais; atributos em desuso. Os valores, outrora indispensáveis para manter uma aparente coesão social, hoje são relativos. Cada um tem os seus e os gere conforme as necessidades; a seu bel-prazer no afã de sobreviver.

A honradez de um ofício está também à venda. O lugar, a posição e o cargo têm um preço. São usados para pagar o carro, o botox, a roupa de grife falsificada e resolver a vidinha da aparência, de geladeira vazia, filho abandonado em colégio caro e professor despreparado.

Mães matam filhos; pais matam mães; filhos matam pais. A perversão dos atos e das palavras deu lugar a eufemismos para todas as ocasiões. Até furacão virou tempestade tropical e desnutrição, simples “desalimentação”. Todos têm de ser competitivos, flexíveis. Modernos. Essencialmente globalizados. Em nome de um presente incerto e um futuro ignorado.

É chique fazer fila. Bonito ser homossexual. Que fatal. Carro novo, sem qualquer segurança... É legal! O filho na escola não aprende. O professor que fala pior que o aluno, não ensina... Não é importante. Quando é, é só um caso insignificante; uma dor acaecente.

As leis subjugaram-se à emoção gerada pelas cadeias de televisão. A política fiscal é tabu. Reforma tributária nem pensar. Em finanças obscuras e desvios alipotentes, não se mexe. Para quê? Os impostos protegem a todos... Até as obras super-hiper-faturadas no rio da sonegação.

O Brasil é o país das muitas leis. Belas e extraordinárias. Poucas praticáveis e muitas absurdas. Como seria perigoso se todos as conhecessem e soubessem usá-las.

Coagidos por políticos que roubam e constroem pontes a lugar nenhum, viadutos sobre o nada e aeroportos desertos, os cidadãos se alagam... nos rios que transbordam; na falta de saneamento; nos hospitais infectados; na água com frango; no peixe alagado; na emoção de ser assaltado... Com multas são condecorados.

Brasil dos consumidores: compram, exibem... E existem.

Vivem das prestações de “déiz vez sem juro”, pra terem vida de remediados. Celular de última geração, computador com internet e “férias” em Paris, Roma e Lisboa a ver se descolam um bico por lá que lhes permita comprar um cobertor. 


Aos filhos põem nomes dos canastrões da novela do momento, das anoréxicas em foco ou do jogador de futebol melhor pagado. Tudo na perspectiva de um dia os Ronaldinhos e Vanessinhas tornarem-se igualzinhos e sustentarem os progenitores. 

Sem pé-de-meia e arcabouço para manter o conto de fada, sonham. 

É o Brasil sonhador.

No mistério do “insider” deram para ver, ouvir e ler as vidas que nunca terão. Mergulham nas séries da TV a cabo e nos dramas reais e ficcionados. Todos passaram a ser parentes da criança morta ou raptada; choram com amores da HBO e nas histórias em alta definição. Todos querem uma nova televisão. 


Ao viver a vida dos outros não se angustiam a pensar nas próprias. Nem nas demais no andar de baixo; nas drogas que o filho esconde debaixo da cama; nem no segundo aborto da filha de quinze anos.

Brasil varonil dos navegantes solitários, do E-mail, do MSN, do blog e das salas de bate papo cheias de pornografia, de acéfalas e desvairados. Brasil intenso, de raio vívido, faz travessias no deserto acompanhado do teclado e da imagem refletida na tela do computador. Que agror!

Obedientes e humildes, incapazes de tomar o futuro pelas mãos, esperam, enfim, à soleira da vida, que o tempo passe sem melancolias e novos martírios. Nas passeatas se dão as mãos. Na mesa há pouco feijão; o arroz é caro demais pra comprar... Tem ovo. O carro na garagem está supernovo com cinqüenta “prestação” a pagar; a televisão chama e a criança reclama.

Mais um novo imposto está pra nascer!

Visite o Brasil. 


Experimente a emoção de viver um seqüestro relâmpago e ganhe de brinde uma multa.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Rasgado rouba esfarrapado e morre.

Brasileiro morre esfaqueado por ter roubado um sanduíche.

Aconteceu em Madrid na madrugada de terça-feira, da semana passada. Luciano W. N, de 30 anos, assim se chamava o ladrão, morreu depois de roubar um dos sanduíches que um vietnamita ambulante vendia na rua Fuencarral, em frente ao nº. 27, no bairro de La Chueca. Já vão pra mais de 20 as mortes de brasileiros nesses arrabaldes de Madrid. Que tristeza!

Luciano, o brasileiro morto, de fome também, tentou comprar um dos sanduíches que Nguyen H. A., de 20 anos, vendia em cima de uma caixa de papelão, pousada na calçada. Como a qualidade deveria ser de "primeira", pediu desconto. O vietnamita não deu. O brasileiro roubou-o. O vietnamita chamou os amigos. Estes correram atrás do brasileiro e o brasileiro morreu. Esfaqueado. 


Que morte!

Quando li esta notícia no jornal El País, acabava de embarcar num vôo rumo a Londres. Sempre tenho o azar de ler este tipo de informe ao entrar em aviões. Sempre são sobre brasileiros. Interessante que no Brasil não leio o mesmo sobre europeus.

Pedir desconto num sanduíche de rua? Vendido por um outro miserável? É o cúmulo da pouca vergonha, da falta de caráter e da cara de pau que os brasileiros fazem questão de demonstrar aqui e alhures e onde quer que vão. E de fome, igualmente.

Não sei como este fato foi transmitido aí no Brasil e que impacto teve. Se teve. Eu fiquei chocado. Uma raiva dolente sangrou-me as entranhas. Brasileiros nunca foram respeitados na Europa nem em qualquer outro lugar. Parecem que fazem questão disso. As mulheres têm fama de putas; os homens de travestis... E agora de crápulas que roubam até sanduíches de outros tão ou mais miseráveis quanto eles.

Não se pode julgar um balaio de maçãs por causa de uma que está podre. E quando muitas e muitas estão putrefatas, como se julga esse cabaz? É a geração Lula exportando a educação petista. Não foi só a ética, a moral e a honradez que esse Lula acabou no Brasil. Acabou também com a dignidade, com a decência e com o orgulho de ser gente e não um animal.


Três avisos aos brasileiros e brasileiras que pretendam vir para a Europa:

Não viagem com a mentalidade nacional de pedir desconto nas compras. Europa não é Brasil onde existem mascates que se disfarçam de comerciantes e se intitulam empresários. Por isso o desconto é tão comum. Mascates são desonestos e ladrões. Na Europa, o comércio é composto por pessoas, [na sua grande e esmagadora maioria], íntegras com visão comercial a longo prazo. 


Existem bem poucos com a calanha e mentalidade brasileira.

Não pensem que na Europa existe o ‘jeitinho’ brasileiro. Não existe! Não queiram dar uma de espertos(as), porque acabam num necrotério como esse infeliz do Luciano e tantos outros e outras que exportam o Brazilian way of live. 


O modo de viver brasileiro está errado, é promíscuo e sem vergonha; só serve para o Brasil sob o governo Lula, petísta ou tucano, sob os augúrios da TV Globo.

Às mulheres, recomendo fortemente que não venham tentar ‘arrumar marido’. Além de correrem o risco de serem maltratadas, poderão ser presas quando os favores sexuais deixarem de interessar. 


A mulher brasileira na Europa não é respeitada. Salvo raras e precisas exceções, tem má fama em todos os sentidos. 

A moda atual é a seguinte: Quando um sujeito se cansa de uma brasileira denúncia-a às autoridades policiais por causa da situação ilegal em que ela se encontra. A polícia irrompe no apartamento do sujeito, à causa de uma denúncia anônima, geralmente quando o proprietário está no trabalho. 

A brasileira é deportada e o sujeito, apenadíssimo, nada pode fazer. Em lágrimas acompanha-a à delegacia e dela se despede. À saída arruma outra. Brasileira, claro. Duas semanas atrás, em Bruxelas, ocorreram dois casos destes. 

Em Lyon, na França, e em Milano na Itália, seis brasileiras foram deportadas de forma semelhante.

6 – Amor alanzoado.

Independente do cataclismo existencial espiralado em que te encontras, há algo que devemos refletir com certa urgência. Aonde nos levará esta aventura da escrita? Depois da primeira palavra digitada, esse é o fascínio, nunca sabemos que emoções se sobreporão até ao final. É como sexo. Quando é bom, sempre esconde aspectos obscuros da relação. Escrever, minha amiga, é optar pelo espírito, sublimando a tentação da carne.

Mas, já reparaste como as cartas de amor são esdrúxulas? Se não fossem esdrúxulas, não seriam de amor, não verdade? Fernando Pessoa já o disse. Parece que atravessamos um túnel sombrio cheio de mitos e lendas que parecem residir na memória como gotas de lágrimas que nos encharcam pingo a pingo. Vivemos lado a lado, em convivência, e apenas nos tornámos peões num alfobre de quadrados onde só enxergávamos quatro lados. Enfim...

Deixámos para trás a época da tolerância e uma disputa de poder desfraldou-se entre nós como a bandeira das hordas da dominação. Banhámo-nos na tina da purificação e ainda assim nos disfarçámos de culpados. Um caso de paixão proibida nos subjugou num leito de amor efêmero. Nunca te vi tão radiante e pura como nesse dia. Diante da alternativa de ser feliz ou sofrer, como todo o ser humano, escolhemos a paixão, a distância e tu, o sofrimento.

Sofres, sim, eu sei; como pecadora antes do batismo. Eu com os tormentos da contrição e em comum o arrependimento da confissão. Quiseram os deuses que nos desterrássemos no degredo do amor que nos consumiu. Como um pecado, pois amar é pecar numa sociedade que se regozija em torturar um ao outro. Parecemos blasfemadores e renegados do amor de Deus. Não temos igreja, nem estado e eu nem cidade. Amedrontámo-nos ante a possibilidade da anunciação e sucumbimos à tentação como pinceladas de Hieronymus Bosch. Todos os nossos rituais do ciclo de vida que nos ilumina já os vivemos sem, contudo, senti-los na sua luminosidade.

Que San Benitos envergamos! Os amarelos da vergonha sem arrependimento ou os negros da condenação à morte? Ardemos em chamas em nome das nossas heresias, porque nelas acreditamos e não nos arrependemos. Como num auto de fé, sem resquícios do batismo.

Tantas perguntas e nenhuma verdade... Como podes existir em tamanha inquisição? Confessa a extensão da tua culpabilidade... Não a mim, nem por mim. Mas a quem te estenda a mão e te convide com excepcional sagacidade para uma amizade, ainda que ornamental.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

5 – Amor rasgado,

olha só como te puseste... Se a escrita gritasse teria ficado surdo. A foto é minha, mulher. Tu a deste. Posso rasgar a cabeça; recortar as pernas; fazer o que me apetece, sem que te peça. Posso até triturá-la em mil pedaços se consolo algum proviesse.

Rio-me. Eu sabia que isso ia acontecer. Já te disse que quando falamos de amor, Maquiavel baixa e se interpõe cheio de malefícios? Especialmente quando estamos a sós. Não acredito que te tenham reconhecido. Que presunção... [risos]. Nem mesmo sabem quem és. Esqueceste o segredo exigido? As entradas desencontradas no apartamento alugado? Eu sempre cumpro o que prometo. Só tu e eu sabemos o que ignoram os demais.

As duas únicas pessoas que nos viram juntos em todos estes anos não entram na Internet. Coitados, mal sabem ler e escrever. A propósito, para que não duvides mais, saiu o visto de permanência deles. Permanente, vê só. Definitivo. Nada de temporário. Sou ou não sou o máximo? [risos] A vaidade me transborda. Agora vou tratar de naturalizá-los para obterem um passaporte que os diferencie dos demais brasileiros. Assim não serão presos quando quiserem sair de férias... Na Bahia serão estrangeiros, vê só que chique.

Mas... Espera aí... Não me digas que tens uma cópia dessa foto? Claro! Que bobagem a minha. Esqueci-me do ego; do alter ego e até do Lexotan. É muita coisa junta. Por isso a cama era tão pequena. Só agora me dei conta. Sabes que quando saías correndo eu sempre me perguntava se tinha a sorte de teres esquecido algum desses atuendos. Inclusive o Lexotan. Nunca se sabe quando se vai precisar. Nas chegadas atropeladas e nas saídas tempestivas, nunca soube a qual prestar atenção primeiro.

E os egos vão bem, dou-me conta. A afinidade que tens com eles é deveras brilhante e nada sutil. Até em letras são difíceis de ignorar. Sem dúvida alguma merecem ser imortalizados. A propósito de imortalização, a matrioshka que me ofereceste quebrou. Hoje de manhã. Sem ninguém lhe tocar, quebrou-se. Vai ver, foram as tuas ondas que explodiram a boneca. Não quero ser cruel ou indelicado, mas achei bom. Um ego a menos.

Fiquei comovido com o teu “exílio que a chorar me vês”. Lindo! Entretanto, não tem alguma coisa errada? Não deveria ser ao contrário? O exilado, auto-exilado, sou eu e tu é que choras? Se quebraste a alma, então deves estar dolorida. O choro está explicado. Parece que tens mais contrições agora do que quando saías... São ironias. Junta os cacos, cola-os e ela ficará nova, de novo. Lembras do custo e benefício? Que ótima oportunidade para colocares em prática a tua própria teoria.

Jamais te escreverei diretamente. Não insistas. Nem ligues para o meu celular brasileiro. Não atenderei. Só o uso quando vou aí. O número local não darei. O que te disser será sempre público; sem segredos; sem mistérios; sem mentiras ou meias-verdades. Deixei de ser petista, exatamente para me poupar e salvaguardar de tais veleidades. Deixei o Brasil exatamente por isso. Nada mais quero disfarçado nem encontros velados. Ler-me ou não ler será sempre uma questão tua. Se quiseres a minha essência, só a terás em palavras abertas que só tu entenderás. O meu abandono também. Portanto, não escutes o grito do vento. Melhor que escutes o seu sussurro e não me apertes assim contra os teus seios. Disseste-me que tinhas o peito rasgado. Como se eu acreditasse... Claro que acredito...

Tu escreveste: – “...você nunca verteu uma lágrima por mim...” – É verdade! Esqueceste que adoro metáforas e alegorias. São divertidas. Mais até que o nosso jogo que já perdeu a graça. Quantos anos foram mesmo? Oito? A frescura do teu mar salgado não tem uma lágrima minha. Era só o que faltava. Mas o céu proporciona mais males aos corações magnânimos.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

4 – Amor assaz

Hoje estou rouco e tu em cotos de tanto escrever. Tanto fez como tanto faz.

Por que uso o blog para te responder? Por um vício antigo de agatanhar o peito; de me exibir a Cristo. Por ter desfilado pela tua rua e ao te deixar nua não quisestes atender. Porque nem Deus me move a te escrever. Até o inferno tão temido não te impede de me ofender. Tampouco quero ver o teu corpo ferido. Ainda que o céu exista não o tens de me dar. O que restou para amar? Lê-me em público com os teus olhos negros, pois amar fizeste em segredo. São palavras, meu anjo. Hoje toca a mim angelizar.

Alguma vez as palavras encontraram asilo em teu peito para fazer-te gozar em minha alegria? Por favor não sofras com a minha dor. Não o faças! Sabes que não vale a pena. Que exagerada és. Sente o palpitar da vida, isso sim. A oferenda da nossa vida; o riso e lágrimas do nosso amor. Faz isso. Se pus nas tuas mãos a minha alma e os sonhos rasgados? Eu nem vi a poeira deles que o teu gesto espalhou pelo chão.

Carlos Drummond, a quem tanto recorres, perguntou certa vez: – “Por que é que revoa à toa o pensamento, na luz? E por que nunca se escoa o tempo, chaga sem pus?” – Vês? Acho que ele nunca soube responder. Da minha parte, como aprendi a conhecer-te, apago a luz, paro o tempo e assim não sinto chagas nem vejo pus.

Obrigado pelos beijos. Agora todos sabem que me beijas... Em letras, sim. Numa palavra. Mas eu beijar-te? Hummm... isso receio, não poderá se dar. Temo tremer ao te abraçar.

Volto a angelizar meu anjo formoso, mãe dos raptados, parente dos assassinados. E a tua vida como anda? O que fazes com ela? Não que me interesse, mas vejo que é sobejo para a ignorares. Novas eleições se avizinham, afinal... Oportunidade ímpar para se repetirem os mesmos erros. Os colossais e persistentes enganos da maioria. Soube que a tua amiga é candidata novamente. Essa mulher parece um herpes, não crês? Não me digas que quer ser eleita para encher com botox os buracos das ruas . Talvez numa parceria com o velho Serra para sepultar de vez a ética nacional? Votarás nela, claro; e nele pra presidente, estou seguro. Rio-me. Que os anjos te protejam. A todos que aí vivem, também. E tu ainda queres que regresse? Sei...

Sei que és fresca como um mar salgado. Doce como néctar. Que suave são os teus seios... Meigos como brisa em final de primavera. Mas... parafraseando Fernando Pessoa, diz-me: – Quanto do teu sal são lágrimas minhas? – Tu sabes como sou. Perco-me fácil no murmúrio de uma promessa e tu nunca encontras a certeza de um sentimento. Eu sei que quando olhas para trás te sentes linda e desejada. Então anda; caminha. Não tenhas medo. A orquestra está a tocar. Caminha. Agora pára! Olha para trás. Como me vês? Ainda te sentes linda e desejada?

Tu me destes o direito de indagar, embora não espere qualquer resposta. É verdade! Crê-me! Arrastar anacronismos românticos faz mal à saúde. Como te disse antes, fizeste das tuas ações a exceção à lei da amizade e cumpriste a regra, infelizmente, de todo o amor. Se nunca antes perguntei nada, foi porque nada havias roubado verdadeiramente de mim. No âmago da tua exacerbada presunção achaste que eu nunca perceberia? Eu te dei um voto de confiança e tu não soubeste merecê-lo. Nada em meu peito os anos hão deixado. Se queres contemplar, contempla. Diante de ti está o deserto e Deus não está por perto.

Ah, sim, “uma boa lembrança terrena é melhor que a boa fortuna”. – Será? Será mesmo? Não sei se concordo com isso. – Que bom que as minhas palavras “te permanecem como uma doce lembrança ecoando sem cessar num moto-contínuo, no teu pensar”. Que lindo! Se não fosse tão profundo até poderia acreditar... que o teu “coração se rasga a cada hora que nos distanciamos”. Anda, clica «aqui» e lê pra lembrares.

E se memória faltar, nunca pensei chegar a tal desencanto. Só a idéia já me horrorizava. Contudo, hoje, agora, faço minhas as tuas palavras. Do baú na minha ermita retiro o teu Alfred de Musset e os versos que gentilmente me contemplaste:

Je te bannis de ma mémoire,
Reste d'un amour insensé,
Mystérieuse et sombre histoire
Qui dormiras dans le passe!
Et toi qtíi, jadis, d'une amie
Portas la forme et le doux nom,
L'ínstant suprême oú je t'oublie,
Doit être celui du pardon.

3 – Amor no ar...

Ah, minha amiga... Agora somos anjos? Se me chamaste de anjo... Quanto do meu limo te contaminou? Quantas absurdas intrigas queres contar? Dos medos que lutei? Das penas que perdi? – Não! – Nem dos enredos que tu acreditas. Eu sei...

A honestidade de hoje não é mais valorizada. O que importa é o dinheiro. Não interessa se sou honesto e tu... Importa sim quem tem dinheiro. Quanto mais tu tens, mais respeitada és; quanto menos eu tenho, mais me faltas ao respeito. Parece que é assim que as coisas acontecem no Brasil, não é verdade? Mas, olha...

Lembras do teu amigo Zé Dirceu? Era um pé rapado, um malfeitor, um seqüestrador. De repente, ficou milionário e hoje todos o bajulam e ouvem os seus conselhos. Não importa o quanto roubou e quantos mandou matar... ou o quanto instiga o azêmola para iniciar um governo totalitário a lo Chavez, amantado em Castro. As portas se lhe abrem e não sei quantas calcinhas caem-lhe às pencas pela frente. E tu...

Tu ainda me chamas de herege? Que eu saiba, em grego, heresia significa opção de escolha. Entendo que não conheças o verdadeiro significado da expressão. Assim, permite-me dizer-te que sou. Sou! Claro que sou! Eu optei por escolher o meu futuro. Se fiz uma opção de escolha, sou um herege, sem dúvida alguma. Não concordo com o que acontece no Brasil nem posso seguir esse comportamento nacional que tanto me envergonha. Entretanto, se com tal palavra pretendes atribui-me o mesmo significado maléfico que a igreja católica dá para me transformares em inimigo ou em alguém que falseia ou não acredita, não poderias estar mais equivocada; tanto na acepção, quanto na dose da temperatura...

Não há mais calor nem fogo, querida. Não reparastes que há muito perdemos o fogo e logo o calor? Sem que para isso tivesses te dado conta? Eu fiquei apenas para tentar parar o tempo. Sou um sonhador incorrigível, já vês. Acredito em paraíso infinito e que cada gaivota é uma promessa. Tu destes vida à minha virilidade e a fizeste cantar como um amanhecer de primavera. Em tua alma vivi um outro universo. Hoje não me disperso...

O que acontece com a idade que quanto mais velhos nos tornamos, mais subvertemos o amor? E às sobras ainda chamamos de amor... Eu chamo! Talvez por me lembrar das tuas formas... dos ângulos onde me achavas e eu te fazia descobrir a ti mesma... A ti...

A ti que embalei em meus sonhos, cheguei a ouvir o que nunca foi dito... e aprendi a saber de mim através do que eu sei de ti. Ah... mas isso é apenas vaidade, que menos tu entenderás. O meu respeito por ti vai além de quanto vivo, embora saiba que nunca fomos um, que somos dois e continuaremos a ser dois. Em toda a nossa vida sempre seguimos caminhos diferentes... Nossa vida? Vê só como me ponho.

Que sinfonia nos ligava à mesma freqüência? O riso? Como era inebriante dançar contigo naquele piso lajotado da Confraria... E no clube? A orquestra era horrorosa, mas o show era só nosso. Lembras? Claro que sim! Nem tantos anos se passaram daquele estúpido vestido vermelho... Da contrição que vivi para descobrir depois que foi por maldade... A mesma iniqüidade do eufemismo dos cravos... Sem razão...

O pensamento faz engolir um vômito de fel... Faz, não faz?

Como se ama o silêncio, a luz e o aroma? Aconselho-te a perguntar a Gonçalves Dias. A mim... Ele me disse que amo em ti tudo quanto sofro.

Liberdade é uma coisa rara minha amiga e há que saber usá-la com sensatez.


Comentários: Para enviar por E-mail clique «AQUI»



x