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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Reflexões sobre o WikiLeaks.

Após ler, completa e detalhadamente, um pouco mais de 200 telegramas, reparei nesta semana que muitos dos documentos que estão sendo divulgados vêm editados.

Isto é, nomes de informantes, ou de membros de governos que repassam informações aos diplomatas foram substituídos por “XXX”. Os códigos de destino, e para copiados, também foram eliminados.

Em suma, os textos dos telegramas atuais, se comparados aos anteriores, (de duas ou três semanas atrás), revelam claramente que receberam uma boa dose de limpeza; inclusive na redação; em alguns percebe-se com facilidade que palavras ou frases inteiras foram apagadas.

Dito isto, se o propósito do WikiLeaks era escancarar as informações diplomáticas, em nome da "liberdade da informação", parece-me bastante contraditório, venal até, que dê uma de censor ou de revisor no seu próprio quintal... e se contradiga, a bem de proteger, (sabe-se lá de quê, ou em troca do quê), quem repassa informações secretas para os americanos...

Informações essas, provavelmente fornecidas a câmbio de dinheiro ou benefícios... pois tais criaturas outra coisa não são, senão indivíduos amorais, sem decência; sobretudo, sem patriotismo. Não dá para enxergá-los, à vista dos assuntos expostos, principalmente os de caráter comercial, como meros informantes ideológicos, motivados por romantismos caducos dos anos da guerra fria.

Conhecer os nomes desses informantes seria muito importante; mais até que o assunto tratado.

Os nomes deveriam - e precisariam - ser revelados no mesmo patamar, e igualdade, com que o WikiLeaks expõe as informações confidenciais e os nomes dos diplomatas.

Se o Wikileaks apaga os nomes dos informantes, também deveria abster-se de revelar os nomes dos diplomatas. Ou revela tudo ou não revela nada; inclusive os documentos. O que não pode é dar uma de censor, ou de paladino hipócrita da proteção individual de traidores dos seus países e pôr a descoberto os nomes de diplomatas, cuja obrigação, inerente aos cargos que ocupam, é a de informar; de ajudar os seus países em tudo que for necessário. De fazer Lobby, inclusive. Por isso são diplomatas.

A persistir essa censura, o wikiLeaks perde sentido. Vira uma farsa. A divulgação dos telegramas torna-se uma imensa fogueira de diplomatas. E coloca o leitor diante de dois pesos e duas medidas... além de gerar vários questionamentos, ente eles, estes:

- Se os nomes dos informantes, palavras e pedaços de parágrafos são apagados, que outras informações mais também o são?

- O que passou a ser divulgado esta semana (e talvez nos próximos meses), tornou-se tão-somente um monte de palavras para alimentar o gosto humano pela fofoca?; e o dos jornais para preencher espaços em edições cada vez mais deficitárias?

Por outro lado, o argumento propalado pela imprensa, - que os documentos estão espalhados por várias agências, e são elas as encarregadas da divulgação, - parece ser ainda mais contraditório que o apagar dos nomes dos informantes. Existe, de fato, uma cabeça e um comando à frente da revelação dos documentos, o sr Julian Assange.

Atribuir responsabilidades a quem não as têm, parece-me um pouco anti-ético...

Que um jornalista guarde em segredo o nome das suas fontes, é um ato nobre e justo. Porém, se esse profissional se dispõe a revelar um documento, supostamente por inteiro, no qual constam nomes comprometedores, e ele próprio os censura, estaremos diante de um plumitivo que usa o documento à laia de chapéu da notícia... ou de rojão para ensurdecer incautos.

Entretanto, o sr. Assange, apesar de se dizer jornalista, confunde "fonte jornalística" (que deve ser preservada), com o autor de uma informação transcrita num documento, cujo conteúdo é narrado por um diplomata e divulgado pelo sr. Assange.

Se o autor de uma informação, e até parte dessa informação são apagados do documento, quem me garante que o resto do texto também não foi modificado?

O sr. Assange? - Infelizmente não o conheço... e pelo rodado da carruagem desta última semana, perdi completamente a vontade de me esforçar para acreditar nele.

Será que deverei me arrepender pelos US$ 1.000 doados para a fiança do fundador do Wikileaks? Acabo de me arrepender.

O que parecia ser ao princípio um ato realmente corajoso, está se convertendo numa pantomima?

A palavra de ordem colocada no site do Wikileaks diz: - “A coragem é contagiosa”. - Será mesmo?

Se acreditarmos que o Wikileaks, - “retira todos os nomes de pessoas que possam sofrer riscos reais de segurança por causa da divulgação”, - igual cuidado não evidencia em relação aos diplomatas ou membros de governos envolvidos, que lutam e defendem honestamente os interesses dos seus países.

Esconder os nomes dos informantes é a contradição plasmada na soleira da prepotência... e põe para questionamento as palavras de Julian Assange publicadas ontem no Estadão: - “O objetivo de revelar informações sobre pessoas poderosas é cobrar responsabilidade deles”.

A frase é de se aplaudir... mas, pelo visto nos últimos telegramas publicados, a realidade mostra-se bem diferente. Novamente dois pesos e duas medidas. Dois pesos esdrúxulos e duas medidas deturpadas.

Em nenhum post do site do WikiLeaks vi qualquer cobrança de responsabilidades. Assim mesmo, se é para "cobrar responsabilidades", maior cobrança deveria ser feita em cima dos informantes que revelam segredos e informações, traindo os seus governos e seus países. Afinal, são eles que alimentam os "poderosos" e os fazem ainda mais poderosos. Informação é poder.

A “organização”, (apenas para citar o mesmo termo empregado por Assange na referência ao seu site), arvora-se em censor de documentos que recebeu ilicitamente, e sem censura, e neles aplica a censura que pretende combater?

Que paradoxo danado de bonito! Como fica a liberdade da informação? Há liberdade, mas sem liberdade? É isso?

Dá até para imaginar - nas asas da suspeita - o que o WikiLeaks pode/ poderá/ poderia fazer, ou lucrar, com os nomes dos informantes que guarda só para si.

Se revela uma parte, obrigatoriamente precisaria revelar a outra; assim manda a lógica e o bom jornalismo.

O Wikileaks assumiu o princípio de proteger traidores, gente amoral que se vende ou repassa, sub-repticiamente, informações importantes a câmbio de algum proveito... E deles, nada lhes cobra... Nem mesmo a metade ou um terço da tal da "responsabilidade" que pretende "cobrar dos poderosos".

Que ilibação é essa? É algum tipo de moral às avessas?

Do alto da sua “insigne responsabilidade” o wikileaks prefere expor, sem peias, profissionais corretos e devotados aos seus países, cujo propósito é o de informar; o de trabalhar pela grandeza e crescimento dos seus países...

Se num documento aparece o nome de um sujeito a trair o seu país, o wikileaks protege-o; porém, se o nome trabalha a favor, é revelado, execrado, exposto ao escárnio público... só porque escreveu, - por dever e obrigação, - o que pensava de fulano ou do pedido desta ou daquela multinacional? Ou que intercedeu a favor dos pilotos que provocaram o acidente da GOL?

Ao ocultar os nomes dos informantes, onde está a liberdade de informação que o wikileaks tanto defende? e diz que exercita...

Pergunto novamente: para o WikiLeaks há liberdade, mas sem liberdade?

É bom descobrir os paradigmas e paradoxos “Wikileakenses”, ou “wikileákikos”... como o leitor preferir.

Os documentos diplomáticos que a “organização” está revelando só mencionam pessoas. No entanto, o sr. Assange prefere ignorar que pessoas fazem e constroem países; pessoas defendem os interesses dos seus governos, das suas instituições.

Nos documentos não há figuras abstratas ou imaginárias.

Se a briga do sr. Assange é com o "império dos poderosos", pois bem, que fique só por aí. Do mesmo modo como protege os nomes dos traidores, também deveria apagar os nomes dos diplomatas dos outros países.

Talvez aí se pudesse entender alguma lógica. Se procedesse assim, seria até possivel fazer um esforço para aceitar essa liberdade sem liberdade que os sr. Assange revela.

É muita prepotência, - e arrogância em excesso - do wikileaks dar uma de “juiz”, “algoz” e "protetor", tudo ao mesmo tempo... quando ele próprio divulga documentos secretos, para os quais não possui, nem lhe foi dada qualquer alforria.

Quem é o Wikileaks para decidir, para julgar assim como assim, que partes dos documentos devem ser publicadas e quais não? Quem lhe deu essa autorização? Os documentos não são dele.

Como pode o sr. Assange decidir quem “vive” ou “morre”? Qual informante narrado deve ser escondido? Qual, no documento complementar, deve ter o nome transformado num conjunto de iniciais?

Manda a lógica da liberdade da informação que, se o propósito é divulgar os telegramas roubados, para "cobrar responsabilidades dos poderosos", essa divulgação terá de ser feita por inteiro... Só assim não haverá dúvidas quanto à idoneidade da intenção nem quanto à tal "liberdade da informação" que tanto apregoa.

Quantos diplomatas americanos e não-americanos já tiveram de ser transferidos pelo constrangimento que enfrentaram após a publicação dos telegramas? Quantas crianças, (filhos desses diplomatas), precisaram mudar de escolas, arrastando todos os traumas que isso causa? Quantos amores (desses diplomatas), foram destroçados? Quantas carreiras foram interrompidas?

Aparentemente, o WikiLeaks é superior a essas minudências pessoais e familiares...

Entretanto, com os informantes, com os traidores, com esses sim, o WikiLeaks se preocupa. Protege-os! Nada acontece! O sigilo permanece!

O WikiLeaks anuncia que revela informações para mostrar os meandros dos bastidores diplomáticos, mas só revela uma parte dos personagens... Interessante!

E os verdadeiros mentores que proporcionam as sinuosidades devem ficar escondidos?

Parece até bizarro que o WikiLeaks esconda traidores... mas é verdade.

Como se diz aí no Brasil, começo a suspeitar que a “organização” quer é "chutar o pau da barraca" e ver o que consegue lucrar; especialmente onde e com quem pode lucrar.

O altruísmo que se dane. Os diplomatas de países alheios, idem. Informação completa e livre é somente um conceito catita do sr. Assange para causar efeito nas entrevistas...

E a Liberdade total da informação? - novamente: Há liberdade, mas sem liberdade? É isso?

Melhor jogarmos ao saco o conceito wikilukediano da "liberdade total de informação". Dessa maneira, fechado o saco, não precisaremos mais exercitar a curiosidade para ler documentos envoltos no propugnáculo de uma liberdade acanhotada...

Na verdade, e para desprazer meu, no frigir dos ovos não há diferença alguma entre os atos do Wikileaks e os atos expostos nos telegramas que tanto a “organização” quer expor ao opróbrio... para "cobrar responsabilidades".

É fato que a revelação dos documentos expõe ao léu as vísceras da diplomacia americana; porém, afeta muito mais os países envolvidos.

Eles são os grandes prejudicados. A Arábia Saudita, melhor que qualquer outro, prova desse prejuízo.

O WikiLeaks, na contra-mão do que propaga, na sua liberdade-sem-liberdade, com a sua censura, encarregou-se de lançar uma onda de suspeitas de traição por cima de todos os membros dos governos que mantiveram contatos com diplomatas americanos.

Ao apagar os nomes de alguns poucos, com estômago para a felonia, proporcionou dores de barriga em muitos outros... que a estas alturas devem ter entrado em catarses recordatórias compulsivas sobre o que falaram com os americanos.

Outro exemplo dessa catarse é a defesa do Lula a respeito dos vazamentos ou a notinha de Paulo Coelho, no seu Blog, antecipando o que viria a público sobre José Dirceu. Estratégia para minimizar os estragos.

O meu avô dizia que quem conta primeiro, conta duas vezes. Será que o Chavez da Venezuela está feliz por ter descoberto que o Lula, Celso Amorim, Top-top Garcia e Zé Dirceu possuem duas caras? ou talvez três? Da minha parte, convicto estou, esses quatro fidalgos, de fina estirpe proletária, têm individualmente uma meia dúzia à vista e outras quatro escondidas no bolso.

Bem acertado escreveu o embaixador John Danilovich no telegrama 05BRASILIA2219, referente a Zé Dirceu: - “... não podemos deixar-nos levar a acreditar que este camaleão cruel e brilhante está disposto a ir tão calmamente para a escuridão - ainda não”.

Dito isto, nem vale a pena falar do Lula ter ignorado o brasileiro preso em Cuba. Todos conhecemos o (des)caráter do "cara". Transcredo dois parágrafos do telegrama 04SAOPAULO493: (*)Dirceu reconheceu que o governo cubano não tem sido receptivo às conversas privadas do governo brasileiro referente ao tratamento dos presos. Ele disse que o embaixador cubano, recém-chegado a Brasília, havia-se recusado a discutir qualquer questão a respeito, inclusive sobre a situação de um cidadão brasileiro que tinha sido preso em Cuba por cumplicidade no tráfico ilegal de imigrantes”. (**) "Dirceu acrescentou que Lula recebeu a mãe do brasileiro preso em Cuba. Questionado se o governo Lula iria considerar receber as mães de dissidentes cubanos detidos como um gesto de solidariedade, Dirceu respondeu que vai discutir a idéia com outras pessoas no governo brasileiro, incluindo o Presidente".

Da mesma forma, vou deixar passar o leva-e-traz do embaixador brasileiro, na Venezuela, (doc. 06CARACAS1276), a coletar informações dos cubanos, iranianos e bolivianos para depois repassá-las aos americanos. Esse detalhe, que arrebentou com a credibilidade do sr. João Carlos da Sousa Gomes, certamente passou desapercebido ao sr. Assange. Para ele, assim me revelam os últimos documentos que editou e publicou, resguardar nomes de traidores e de vendilhões dos seus próprios países é infinitamente mais importante que a reputação de um diplomata.

Novamente! eu não me canso de perguntar: Assange prefere proteger traidores, e não os diplomatas?

Será que, por um desses acasos da vida, o fundador do Wikileaks sabe qual é o verdadeiro trabalho de um embaixador?

O sr. Assange tem alguma idéia, por mais remota que seja, sobre o status de funcionário público que possui um embaixador?

Que um diplomata credenciado num país lá está para cumprir as ordens do seu chefe, geralmente um chanceler, ou as do seu presidente, ou as do seu governo?

Que os atos que um diplomata executa são pautados em cima de objetivos prévios e de interesse do seu país de origem ou, como muitas vezes acontece, dos interesses dos seus chefes?

Creio que o sr. Assange desconhece que um embaixador, a despeito de todo o glamour e pompa que desfruta no exercício do cargo, romantizado e romanceado no enlevo da prosa de Somerset Maugham e outros tantos escritores, é, em síntese, nua e cruamente, um funcionário público, "um pau mandado" que obedece ordens.

A quais "poderosos" - exatamente - o sr. Assange quer atingir? Até agora, pelo que vi e li, só tem arranhado ou arruinado a reputação, a credibilidade e, provavelmente, algumas carreiras desses funcionários.

Mas os traidores, os verdadeiros vilões, os que se vendem por três patacas, às vezes por milhões, ou até por uma soirée de sexo selvagem com alguma attaché, esses, os que alimentam os tangos e dão sentido às valsas diplomáticas, o sr. Assange esconde, protege, apaga os nomes...

Até agora, e duvido que apareça, não vi em nenhum telegrama o nome de qualquer magnata, nem de nenhum banqueiro... ou até de um simples mega-investidor... embora tenha visto, sim, os nomes de alguns capitães de indústrias.., que também obedecem ordens.

Que esquisito! Que ética mais distorcida! Que forma mais desastrada do Sr. Assange "cobrar responsabilidades dos poderosos" através do seu suposto conceito de liberdade de informação, censurando o principal dessa informação.

O sr. Assange faz-me lembrar aquele promotor, o Luiz Francisco de Souza, o orelhudo, que a serviço do PT deslanchava as mais absurdas denúncias só para ferrar com os tucanos e permitir a ascensão do Lula. Hoje, condenado e relegado a uma mesa, num canto sem janela, do ministério público, passa a vida a responder a processos e mais processos por calúnia, por injúria e outros crimes tantos.

Para finalizar, - entrando na onda dos dois pesos esfanicados e das medidas destrambelhadas do WikiLeaks, - só para ilustrar mais um pouco, estranho que não tenham sido apagados os nomes de Nelson Jobim (falando mal do Itamaraty ou lavando roupa suja de colegas ministros), de Bill Perry, (relatando os desabafos de José Dirceu), ou de 3 oficiais militares, 2 membros do governo petista e de 1 delegado da Policia Federal, mencionados nos documentos que marquei com a etiqueta “Vale a leitura”, relacionados neste blog «AQUI».

Em relação aos documentos Europeus, se a paciência me abraçasse, poderia até mencionar mais uns oito ou dez casos idênticos... mas ela está de mal comigo.

Será que os nomes desses indivíduos e respectivas informações, tal como o nome do embaixador na venezuela, escaparam da atenção do(a) censor(a) wikileakiano(a)?

Como o leitor poderá perceber, há muitas perguntas sem resposta e demasiadas contradições sobre um assunto que começou como uma demonstração de liberdade de informação, digna de aplauso, isso penso, e se transformou numa liberdade cerceada, censurada, alterada, rasurada, escondida pelos próprios que defendem a tal da liberdade da informação.

O WikiLeaks perdeu sentido informativo, credibilidade e até aproveitamento histórico. Virou uma farsa canhestra!

Uma verdade não pode ser contada pela metade sem correr o risco de virar meia mentira... embora a História, infelizmente, bem o sabemos, esteja cheia de meias verdades... tal qual como no meu povoado, lá em Minas Gerais, na minha infância havia uma porção de meio-virgens.

Leia também:

Reflexões sobre o WikiLeaks – parte 2

Fã petista ensina como ler documentos do WikiLeaks. Pode?

Lula defende WikiLeaks. Por quê?

Julian Assange e o WikiLeaks


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