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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Os filhos das camisinhas furadas

Indigne-se!

Ou se preferir, no original: Indignez vous! – Em francês soa mais chique, mais peremptório.

Talvez provoque alguma reação nos brasileiros... que tanto gostam e vêem Paris como a capital do bom gosto, a Meca das férias sonhadas... pagas intermitentes no crediário a perder de vista.

Indignez vous! É o que eu diria para esses brasileiros... Também lhes diria que é errado falar “bifê”. O correto é Bufê, com ênfase no ‘U’ e som de ‘U’. O mesmo vale para Menu e não, “mêni”... Muito menos “pirê”, quando o correto é Purê! – Purê de batatas, e não “pirê de batata”.

“Indignez vous! (pour une insurrection pacifique)”, por uma insurreição pacífica, é o título de um livrinho de 30 páginas, escrito por Stéphane Hessel, que me caiu ontem nas mãos, (finalmente), ao cair da tarde, na minha parada habitual na livraria perto de casa.

Andava doido para conseguir esse livro.

O leitor já pode imaginar que o li de uma assentada só. Na Europa não se fala de outra coisa. O WikiLeaks deixou de interessar. Não sei se o livro está à venda no Brasil. Foi lançado em Paris, em Outubro de 2010. As edições têm-se esgotado uma após a outra. Se você não o leu, recomendo. Vale a pena.

Com uma hora e pouco de leitura, na última página a memória entrou num caleidoscópio de reminiscências que me transportaram aos meus tempos de estudante insurreto, aí no Brasil; à minha luta para ajudar o comecinho do Partido dos Trabalhadores; à prisão pelo DOPS (cuja indenização por prisão política jamais pedi, nem pedirei); e, como não podia deixar de ser, à decepção em 1990, quando descobri que o Lula era um bandido, Zé Dirceu outro pior e que o PT não passava de uma corriola de vigaristas a enganar o povo.

Para Stéphane Hessel, o "motivo básico da resistência é a indignação”. O meu avô dizia o mesmo. Talvez por essa influência muitas vezes indignei-me com o que acontecia no Brasil... E continuei a afligir-me mais com todos os petistas... Talvez por ser dos poucos capazes de enxergar que o Lula fazia pior, tendo sido eleito para fazer melhor... e o povão, em estado de apatia e ganância absolutas, deixava-se levar pela lábia mefistofélica do apedeuta.

É certo que as razões para ficarmos indignados no mundo complexo de hoje podem parecer menos evidentes do que nos dias de Hessel, na luta contra o nazismo; ou nos da ditadura militar da minha juventude. Mas "procura e acharás!", escreveu Hessel. Embora essa frase não seja originalmente dele, é a consigna que alguns homens sempre têm em mente para provarem a si mesmos que são homens de bem e não carneiros obedientes à voz do pastor, nem fazem parte da patuléia de “cegos” e “surdos” como infelizmente existem no Brasil.

Indignação e inconformismo são os combustíveis necessários para nos impulsionar a melhorarmos a nossa vida, amenizando simultaneamente o infortúnio do nosso semelhante e/ou da comunidade onde vivemos. Uma coisa depende da outra; está ligada à outra. Uma não acontece sem a outra. Nisso acredito.

Nos países do mundo onde o fosso crescente entre os muito ricos e os muito pobres é cada vez maior, embora no Brasil se viva a vergonhosa ilusão de que as classes C e D melhoraram de vida, deveria ser motivo para a juventude brasileira resistir a Lulas e Dilmas... especialmente pelo que são essas duas infaustas criaturas, pelo passado vergonhoso que tiveram e pelo nada que fazem à frente dos governos, exceto o de enriquecimento ilícito.

O tratamento desumano dado aos indocumentados, aos imigrantes, aos negros, aos ciganos... A ansiedade de querer sempre mais; a competição desenfreada na escala social; a ditadura dos mercados financeiros; o despudor dos marketeiros em manipular e enganar a opinião pública; a Segurança Social relegada apenas às promessas de campanha... e até os brados da resistência sufocada contra a Justiça corrupta e sem justiça, deveriam ser motivos de indignação dos brasileiros. "Motivos para insurreição pacífica", especialmente dos jovens, como escreveu Hessel, pois a eles o futuro do país pertence.

Stéphane Hessel tem 93 anos. Se o meu avô fosse vivo completaria este mês 114. Contudo, apesar da diferença de idades, ambos foram contemporâneos na Segunda Guerra Mundial. Lutaram sob a mesma bandeira da Resistência Francesa. Hessel foi preso e deportado para o campo de concentração de Buchenwald. Meu avô, do campo Sachsenhausen conseguiu fugir para a Suíça. Terminou os seus dias em Minas Gerais, no Brasil. Azar dele pelo desamparo de vida que teve; sorte a minha, porque me ensinou a ser homem digno; a não me submeter principalmente àqueles que se declaram “salvadores do povo”... pois deles, maiores desconfianças haverá de se ter.

É uma pena que os brasileiros não gostem de ler e os jovens tenham abraçado o Twitter como fonte primária de informação. Se lessem o livrinho de 30 páginas que Hessel escreveu, talvez pudessem aprender a se indignarem antes dos fatos ocorrerem e não depois.

Conseqüentemente, talvez tivessem vontade e conhecimentos para reagirem no tempo certo, e não de retroagir por meio de atitudes e mensagens deploráveis, todas elas piores do que as cometidas por aqueles contra quem querem resistir.

Meu avô apelidava esses jovens de “filhos das camisinhas furadas”. Acidentes que a tecnologia do latex não soube evitar. Como não eram para nascer, mas nasceram, a Natureza foi apanhada de surpresa. Não estava preparada para aprovisioná-los a tempo com os atributos normais, dados a qualquer Ser que siga o curso natural. Por exemplo, Inteligência falta a quase todos eles. E se alguns a recebem, falta-lhes Honestidade ou Sentido-Comum...

Segundo dizia o meu avô, esses três atributos não atendem a qualquer um, principalmente numa emergência Nem mesmo se a Natureza pedir:

A Inteligência é senhora requintada, cheia de salamaleques; requer tempo e cuidado para poder se transmitir a um cérebro recém-formado.

A Honestidade é dama vaidosa, faladeira, mas sofre de complexo agudo de inferioridade. Tem baixíssima auto-estima. É uma Maria-vai-com-as-outras. Raramente tem opinião própria. Ademais, é difícil encontrá-la disponível; anda sempre metida em manifestações a tentar se afirmar. A Natureza só consegue encontrá-la com dia e hora marcada.

O Sentido-Comum é um velho ranzinza, introvertido, que sofre de transtorno obsessivo compulsivo. Tem medo de tudo; até de pôr os pés fora de casa. Só sai se a Honestidade e a Inteligência o forem buscar na porta. Nem a própria Natureza consegue levá-lo pela mão.

Portanto, para qualquer nascimento indevidamente programado, a Natureza vê-se incapaz de chegar perto dos três e avisá-los em cima da hora que uma camisinha se rompeu e alguém vai nascer... e eles precisam correr para lá.

Na maioria desses “chamados-às-pressas”, a Natureza recebe um não na cara. Então o filho ou filha da “camisinha furada” nasce sem as três qualidades; ou nasce apenas com uma ou duas...

Inteligência e Sentido-Comum são os mais relutantes em atender urgências...

É o caso, por exemplo, daquela moça, Mayara Petruso, com a sua mensagem “tuítada”:

- “Nordestino não é gente, faça um favor a SP, mate um nordestino afogado!
Quando eu li a notícia tive até vontade de telefonar para perguntar-lhe como se mata um nordestino afogado? Primeiro, porque no Nordeste não há lá muita água. Segundo, se ela já diz que o coitado está afogado, portanto, subentende-se que está morto, morrido, falecido, estirado no chão... Como será que a sumidade pretendia matar "um nordestino agogado", alguém já morto?

É uma pena que não tenha “tuítado” as instruções. Se o tivesse feito, como diria o meu avô, talvez não ficássemos na dúvida da moça ser ou não uma cavalgadura com duas albardas em cima, carregadas de livros, zurrando para a inteligência acudí-la. A moça se diz (ou dizia), estudante de direito...

Pelo menos, em relação à Mayara, com uma certeza ficamos: o português dela é muito ruim.

Stéphane Hessel não é tão desbocado no livro como o meu avô era nas palavras e eu sou na escrita. Entretanto, depois que terminei a leitura, percebi algo em relação ao Brasil que jamais havia notado:

Os jovens brasileiros não sabem se indignar a tempo e a horas; e quando se insurgem é no momento cronológico posterior ao fato, da forma mais beócia possível e com decoração inapropriada. A juvenil luta armada, pós 1964 e todos os disparates que cometeram, prova bem que de lá para cá nada melhorou.

Nem no passado, nem no presente eles conseguem se indignar no seu devido tempo. Nem durante os aviltamentos ou abusos. Tampouco se insurgem diante das evidências, das provas, ou das mentiras.

Parece até que se alguma inteligência possuem, ela é retardatária... Talvez seja manca ou sofra de artrose...

Veja o que ocorreu no dia da posse da Rousseff: Milhares de mensagens foram trocadas entre jovens que clamavam para que um atirador de elite se dispusesse a "atirar" e "matar a presidente" durante o desfile no carro aberto.

Eis algumas mensagens mais “argutas”. A que está em negrito eu gostei. Revela bem a leviandade e insensatez em relação ao processo político que ocorreu e ocorre no Brasil. Na verdade, os 4 exemplos selecionados provam tão-somente a falta de cidadania e responsabilidade cívica dessa meninada. Demonstram sobretudo a ausência da inteligência, cujo espaço deve ter sido ocupado por “mil” frustrações pessoais... o que nos dá a certeza de serem filhos e filhas de camisinhas furadas.
– "Bem agora podia vir um atirador de elite e acertar a cabeça da Dilma, maldita.” – dizia uma das mensagens;

– "Matem essa Dilma de uma vez, por favor. Algum atirador acerta na cabeça dela e outro no vice dela.” – dizia outra;

– "Algum atirador de elite está on-line?? Só avisando que daqui a pouco a Dilma vai desfilar em carro aberto... só um aviso... nada de mais..."

– "Tem algum atirador disposto a dar um tiro na cabeça de Dilma quando ela estiver subindo a rampa do planalto?".
Será que algum dos autores dessas mensagens se deu conta que a mulher já havia sido eleita há três meses, por maioria absoluta... e nos dois turnos?

Só agora despertaram para a realidade? Por onde andaram durante os meses de Setembro e Outubro? Ficaram enfiados em algum buraco com tampa, desde janeiro de 2010?

Se a estupidez fosse um esporte olímpico, a moçada brasileira estaria recoberta de medalhas de ouro, de prata e de bronze... Os “caras pintadas”, de verde e amarelo, só teriam com que se orgulhar... assim como se envaideceram das imbecilidades que cometeram na época.

Da mesma deficiência devem sofrer os que queimam índios a dormir nas paradas de ônibus, ou agridem empregadas domésticas... por serem domésticas; ou quebram lâmpadas nos rostos dos viados a paquerarem na Av. Paulista...

Aqui entre nós, haveríamos de nos perguntar o quê e onde esses jovens estudam?; ou fazem nos colégios e faculdades que assistem?... Melhor ainda: será que essa garotada tem pais e mães de verdade ou serão todos eles filhos de damas da necessidade, nas quais as camisinhas se romperam?

Durante todo o processo eleitoral ficaram mudos! Durante os 12 meses de mensalão, meia dúzia se vestiu de preto e o resto calou! Diante das constantes e repetidas mentiras do Lula, nem piaram. Ao ouvirem as barbaridades ditas pelo presidente da UNE e do corrupto que se mostrou, ficaram autistas! Dilma Rousseff é uma ladra de bancos comprovada, que nada tem a ver com luta política, mas isso tampouco os incomodou quando a mulher se postulou à presidância...

Depois das portas arrombadas é que se desataram manifestar? Ora, ora...

Esses “tuiteiros” recordam-me as famílias que constroem casas em cima de lixões ou nas encostas dos morros... Quando a enxurrada da chuva leva tudo por água abaixo, eles choram, gritam por justiça... por moradias... pelo auxilio das prefeituras... pelo pai morto... pelo filho soterrado... e queimam pneus e ônibus nas ruas, danificando os transportes que os servem e o asfalto por onde transitam...

Como escreveu Stéphane Hessel em seu livro, sem instrução não há idéias... E com ambigüidades por objetivo, jamais uma insurreição pacífica ou armada poderá triunfar, porque não há indignação genuína e sim, apenas um ir às forras; tal qual mulher corneada que transa como o melhor amigo do marido só para se vingar. Não há glória nem vingança. Há só mais um ato patético... e um palavrão feio para denominá-la.

Brasileiro só se indigna ou insurge politicamente na época do FEBEAPÁ (Festival de Besteiras que Assola o País), porque tudo termina numa grande festa zoada, com muitas pizzas, gargalhadas e mais camisinhas furadas.


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